Este artigo foi publicado na revista Conhecimento Prático Geografia. Elaborei este material afim de relatar um pouco mais sobre a geografia da cidade de Salvador.
Ao longo da história, os aspectos naturais promoveram forte influencia na transformação da paisagem soteropolitana. A natureza constrói um forte sentido de identidade pela população local. Também não é pra menos. Salvador é dotada de inúmeras riquezas naturais presentes em seus ecossistemas, em suas águas e na sua peculiar forma de relevo.
São muitas as pesquisas que colocam Salvador como objeto de estudo. Porém são poucas aquelas que dão enfoque à geografia física da capital baiana. Os estudos referentes ao meio natural são de suma importância para compreender a organização do espaço urbano da cidade.
Salvador, o mar e o oceano
Salvador é uma cidade cercada de água em grande parte de seu território. São aproximadamente 50 quilômetros de orla que se estende desde a praia do Flamengo, ao norte da cidade, até a praia da Ribeira. Esta característica é dada graças ao formato triangular de Salvador, que está situado em uma área peninsular.
Figura 1 - Área territorial da cidade de Salvador banhadas pelas águas da Baía de todos os Santos e do Oceano Atlântico.
De um lado, a capital é banhada pelas fortes águas do oceano atlântico. De outro, pelas calmas águas da Baía de Todos os Santos. Ao sul, encontramos o ponto que separa a Baía de Todos os Santos do litoral atlântico. É ali que fica localizada a Ponta de Santo Antônio, local de edificação do Farol da Barra, um dos mais importantes cartões postais da capital baiana.
Figura 2 – A Ponta de Santo Antônio delimita a Baía de Todos os Santos (à esquerda) do Oceano Atlântico (á direita).
Dotada de inúmeras praias, a orla atlântica é bastante apreciada pelos banhistas e praticantes de surf. Muitas das praias possuem uma grande quantidade de recifes rochosos, formando verdadeiras piscinas naturais na maré baixa. Algumas delas são abertas, como é o caso da praia de Jaguaribe, muito apreciada pelos surfistas. Ao longo da história, a população local encontrava nas águas do litoral atlântico as suas principais fontes de sobrevivência. Hoje em dia as coisas mudaram. Mesmo assim, a pesca artesanal ainda está bem evidente nas puxadas de rede, nas feiras e nas colônias de pescadores presentes na região.
Com uma área de 1.233 km², A Baía de Todos os Santos é considerada a maior do Brasil, perdendo apenas para a baía de São Marcos, no Maranhão. Suas águas fornecem proteção e segurança para o transporte marítimo local. No caso da capital baiana, é no seu litoral que encontramos o Porto de Salvador, além de marinas e pequenos atracadores. As balsas e o sistema Ferry Boat garantem o transporte de pessoas para as ilhas e demais localidades do recôncavo baiano. A pesca artesanal ainda é favorecida pela abundância de peixes e frutos do mar. A baía também possui em suas margens uma das maiores reserva de petróleo em terras continentais do Brasil, o que favorece a economia regional e brasileira.
Do ponto de vista histórico, a Baía de Todos os Santos foi ponto de partida para o desenvolvimento econômico Brasileiro. Não é a toa que este foi o local de edificação da primeira capital do país. Ela foi descoberta por Américo Vespúcio no dia 1º de novembro de 1501, data comemorativa do Dia de Todos os Santos, fato este que originou seu nome.
Em 1549, Tomé de Souza, o primeiro governador geral do Brasil, chegou às terras tupiniquins destinado a cumprir a importante missão de escolher o local ideal para a construção da primeira capital brasileira. Para isso, o fidalgo recebeu recomendações do Rei de Portugal D. João III que aconselhava a escolher um local protegido, de bons ares e com abastança de água doce, onde pudesse ser construído um porto e a famosa cidade- fortaleza.
O local escolhido não poderia ser melhor: nas calmas águas do Kirimurê (nome dado pelos índios tupinambás à Baía e Todos os Santos). A reentrância da costa do litoral baiano fornecia proteção aos futuros moradores da cidade. Ela proporcionava uma limitada via de acesso aos possíveis invasores que viriam pelo mar. Bem próximo ao porto, o alto da escarpa da falha de Salvador proporcionava uma visão privilegiada de toda a baía. Além disso, a área possuía água doce em abundância que brotavam das fontes córregos e minadouros da região. Muitos deles bem próximos ao mar.
Durante mais de dois séculos (XVII a XIX), a baía de todos os Santos foi a principal porta de entrada do Brasil com o mundo. É nela que existia o maior atracadouro de navios mercantes do hemisfério Sul. A cana de açúcar e posteriormente o fumo produzido no Recôncavo baiano eram transportados até o porto de Salvador, que abasteciam as embarcações responsáveis por exportar essas e outras matérias primas. Mesmo com a independência de Portugal em 1822 e a mudança da capital do país para o Rio de Janeiro, Salvador permaneceu com esta dinâmica portuária e marítima até meados do século XIX.
A água doce de Salvador
Em geral, Salvador apresenta uma densa hidrografia que preenche seu território com rios, córregos e pequenas lagoas. As águas subterrâneas, ainda estão presentes em quantidade e com boa qualidade para o consumo. Em algumas áreas, ainda é possível recolher o líquido através das fontes, bicas e minadouros existentes na capital. O clima quente e úmido garante a constante reposição de suas águas. As precipitações anuais variam de 1300 a 2300 milímetros, não havendo estação seca. A maior parte das chuvas ocorre no outono e no inverno, com destaque para os meses de abril, maio e junho.
As formas de relevo e a estrutura geológica presentes no território irão contribuir para sua hidrografia. Primeiramente, devemos levar em consideração a presença da grande falha geológica de Salvador. É ela que divide a capital baiana entre cidade alta - que abrange a parte mais elevada do relevo escarpado da falha de Salvador, e a cidade baixa - que corresponde à área mais rebaixada e banhada pela Baía de Todos os Santos. A falha de Salvador irá direcionar o encaminhamento dos rios e dos córregos soteropolitanos em duas vertentes principais: a do Atlântico e a da Bahia de Todos os Santos.
Figura 3 – A Falha de Salvador pode ser facilmente visualizada. Olhando em direção ao Elevador Lacerda, observa-se ao fundo um paredão de rocha. Esta é a escarpa que une a Cidade Alta e a Cidade Baixa.
Figura 4 – As bacias hidrográficas soteropolitanas são influenciadas pela falha de Salvador que formam as duas principais vertentes da cidade.
A vertente do Atlântico é responsável por drenar 80% das águas pluviais da cidade. É nela que estão localizadas as maiores bacias hidrográficas presentes, como é o caso das bacias do Rio Ipitanga, Jaguaribe e Camurujipe. A vertente da Baía de Todos os Santos apresenta redes de drenagem com menores volumes e tamanhos, à exceção dos cursos d’água que irão compor a Bacia hidrográfica do Cobre, localizada na porção oeste da cidade. A bacia do Cobre possui uma das poucas áreas relativamente conservadas da capital, sendo ainda responsável por parte do abastecimento do subúrbio ferroviário de Salvador.
Lagoas, barragens diques e represas
Além de possuir uma intensa rede hidrográfica, Salvador é dotada de inúmeras lagoas. Algumas delas bastante conhecidas, como é o caso da Lagoa do Abaeté, de água bastante escura que contrasta com a areia branca das dunas da região. A Lagoa da Paixão é uma das nascentes da Bacia hidrográfica do Cobre. Antigamente era conhecida como Lagoa Encantada por apresentar muitos terreiros de candomblé em seu entorno. Reza lenda que durante alguns rituais pessoas desapareciam misteriosamente na lagoa.
A Lagoa de Pituaçú era antes uma antiga represa criada artificialmente para o abastecimento de água da cidade. Hoje ela é um dos principais atrativos do Parque Metropolitano de Pituaçú, que abriga um rico ecossistema de Mata Atlântica. O dique do Tororó, hoje reduzido a uma lagoa, é o único manancial tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Com quase 460 anos, o dique é chamado de Lagoa Sagrada pelos adeptos do Candomblé.
Com o intuito de garantir abastecimento de água da crescente população soteropolitana, represas e barragens foram construídas, como é o caso das barragens do Rio Queimado e Pituaçú, assim como as Represas de Mata Escura, Ipitanga I e II, da Prata e do Cobre. Infelizmente, com o passar dos anos, o aumento exponencial da população associado à degradação ambiental dos mananciais levaram o governo a buscar água potável em lugares cada vez mais distantes. Atualmente, Salvador passou a receber as águas do Rio Paraguaçu através da barragem Pedra do Cavalo, localizada há 140 km da capital.
Muito bom.
ResponderExcluirQuerido e saudoso Professor Aziz, sempre delicado com as palavras e aulas escritas e faladas.
ResponderExcluirQue estejas em um bom lugar !
Paz e Bem
Gostei do que li! A hidrografia junto a história ficou bem elaborada.
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